Por uma nova mentalidade


Razões do Recurso


Em 22/05/07, LUIZ FERREIRA DA CONCEIÇÃO [....]


Ele não quer retificar sua data de nascimento. Como dito e redito: ele não tem data de nascimento. Ele precisa de uma. Ele não quer aumentar sua idade para obter uma aposentaria rural. O INSS exige 60 anos para o lavrador. Pelo registro de casamento ele teria 85. Seu batistério afirma que ele tem 72. Em ambas as hipóteses teria idade sobrando; não precisaria de nenhum expediente escuso para alcançar um benefício previdenciário. Só não pode pleitear esse ou outro direito porque não tem data de nascimento.


O Sr. LUIZ PEREIRA DOS SANTOS é pessoa de extrema pobreza e devia ter sido mais respeitado como cidadão. Mereceria um tratamento melhor do juízo? Ou não? Se este não estava positivamente convencido sobre a data de nascimento, que custaria utilizar o artigo 1107 do CPC, para “investigar livremente os fatos e ordenar de ofício a realização de quaisquer provas”? Sim, o que custaria?


Das duas uma, ou lhe conferia a data que o assistido diz ter com base em seu batistério (29/10/1935), ou a data condizente com a idade que foi anotada em seu registro de casamento (35 anos em 1958). Só não podia era deixar de mãos abanando o pobre que implora pelos poderes exclusivos de quem podia resolver seu problema.


Cremos que esta Colenda Câmara Cível há de fazer justiça. A prova indiciária acostada às fls. 04, aliada à suficiente informação testemunhal e à exposição dos fatos anotados na manifestação de fls. 11/13 e aos argumentos expendidos nestas razões, são de molde a reconhecer o direito do assistido de ver inserido em seu registro de casamento a sua data de nascimento.


Por todo o exposto, a r. sentença, data maxima venia, deve ser reformada para determinar a retificação do registro de nascimento do assistido, fazendo incluir sua data de nascimento: 29 de outubro de 1935.


O assistido roga a Vossas Excelências que não o deixem muito tempo sem data de nascimento, porque não podendo mais exercer com denodo o árduo trabalho de lavrador, ― pois a idade lhe vem roubando as forças e a saúde, ― haverá de buscar o benefício previdenciário a que faz jus para garantir sua sobrevivência, mas não poderá alcançá-lo enquanto, mesmo tendo idade além da conta, não tiver uma data de nascimento para ver expedidos seus documentos, razão pela qual reclama, também, a aplicação do artigo 71, do Estatuto do Idoso (Lei 10741/03), para conferir prioridade na tramitação do presente feito.


O assistido, por evidente, não pede favores. Reclama respeito. Reclama atenção. Reclama Justiça!


Por fim, além da questão substancial do apelo, cremos que seria de bom alvitre que o Tribunal de Justiça, por suas Câmaras e pelos Procuradores de Justiça com assento nelas, não fechassem os olhos e, de alguma forma, também, passassem a se manifestar sobre o modo como os processos são conduzidos na primeira instância, no que diz respeito ao interesse e diligência do magistrado em favor do direito constitucional à prestação jurisdicional célere (CF, 5º, LXXVIII) e eficaz.


O processo não é propriedade privada do magistrado para que ele o conduza como bem lhe apetecer. Quanto a isso, não há dúvida: “O processo tem impulso oficial. Ao magistrado cumpre zelar pela celeridade e disciplina do processo.” (STJ - REsp 7.304/CE - Min. Luiz Vicente Cernicchiaro).


Membros do Ministério Público, magistrados, defensores, advogados, não podemos achar que toda e qualquer morosidade na justiça se pode desculpar sob o biombo do excesso de processos. Não! Como dizia Bertold Brecht, também, “nós pedimos com insistência: nunca digam, isso é natural!”


Se queremos mudanças, temos que participar delas e não apenas esperar que “os outros” mudem.


Colhemos a propósito, as palavras do presidente desta Corte: “Acho que estão certos aqueles que proclamam que o judiciário precisa ser reformado. No entanto, há que se ter em mente que essa reforma não pode apenas ser de estruturas e de processos. É fundamental que mude também a mentalidade dos operadores do Direito e da própria sociedade. Precisamos de uma mudança de cultura”. [Des. Raimundo Cutrim, Presidente do TJ-MA, 22/02/08, Rio Poty Hotel]


Vejamos o caso dos autos.


A petição inicial deu entrada em 22/05/07 (fls. 02), mas só foi autuada mais de 40 dias após, em 16/07/07 (capa). Autos conclusos em 20/07/07 (fls. 06v), só receberam despacho inicial depois de mais de 130 dias!, em 05/12/07 (fls. 07).


Não há excesso de processos que, honestamente, justifique a falta de zelo com esse e com tantos outros processos, o que poderia ser constatado numa diligente correição. E na Comarca de Mirador nem há processos em demasia.


Não seria razoável representar o magistrado em cada negligência processual, porém, se pelo menos naqueles processos que sobem à Corte, os Procuradores de Justiça e os Desembargadores olhassem, também, essas questões, cremos que aquelas palavras do Des. Raimundo Cutrim deixariam de servir ao vento para alcançarem um sentido prático, real, palpável, com possíveis bons resultados em favor da melhoria da prestação jurisdicional. Ao contrário, se cerrarmos os olhos em favor das eternas conveniências, ou cultuarmos a conivência dos melindres, vamos exigir mudança de mentalidade de quem?


É, também, como apelamos.


Mirador (MA), Qua, 7 de Maio de 2008.


[Se quiser ler o texto integral da apelação, clique aqui]